Palavras Cruzadas // Um sonho recente
Durante muito tempo sonhei que, em momentos de aflição, conseguia voar. Agora que penso seriamente sobre isso, acho que era mais levitar do que outra coisa. De qualquer das formas, permitia-me fugir de situações desagradáveis ou de perigo e podia continuar no meu sonho sem ter de acordar. Essa faculdade mágica que tinha apenas nos meus sonhos foi desaparecendo aos poucos e deixei de conseguir voar. Até que, meses depois de conhecer o meu Pai, voltei a conseguir fazê-lo.
(via Pinterest)
Não é o meu sonho mais recente, mas é o mais recorrente e acontece sempre da mesma forma. O meu pai vai a conduzir e eu vou ao lado dele, no lugar do pendura. Umas vezes vamos na converseta, outras vamos calados. À nossa volta não existe nada, só nuvens. À frente vemos apenas estrada e dá-me a impressão de que estamos numa ponte.
A determinada altura, a ponte tem uma quebra. Deixa simplesmente de existir durante centenas de metros e volta a aparecer mais à frente. Começo a ficar ansiosa. Estamos condenados, vamos cair e morrer. O meu Pai, pelo contrário, segue tranquilo. Umas vezes continua a conversar, outras permanece calado. Aperto-lhe a mão que está pousada na manete das mudanças, como que a acusar o medo que sinto.
Ele diz-me: está tudo bem. Mesmo antes de cair, o carro levanta voo e pousa calmamente no outro lado. E nós continuamos o nosso caminho como se nada tivesse acontecido.
Gosto de pensar que o meu inconsciente associa a possibilidade de voar à presença do meu Pai. Que, com a entrada dele na minha vida, ganhei uma capacidade que havia perdido à medida que fui crescendo. Sinto-me sempre leve e feliz quando este sonho regressa. É como se anunciasse que há novos voos para mim e que posso confiar, que vai correr tudo bem.
Também têm um sonho que se repete de tempos a tempos?
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Este é o segundo post da rubrica Palavras Cruzadas, criada em parceria com o P.A. e, quem sabe, convosco também. A ideia é irmo-nos desafiando uns aos outros através da escrita e escrevermos sobre temas que saem um pouco da nossa zona de conforto ou registo. O tema desta quinzena foi ideia minha e podem ver no blog do P.A. como respondeu a este desafio e que mote lança para a próxima edição.
Acompanham-nos nas próximas edições?