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Rita da Nova

Qui | 15.08.24

O Meu Pai Voava, Tânia Ganho

É sempre complicado avaliar livros de memórias ou com teor autobiográfico; num cantinho da minha cabeça está sempre a questão: quem sou eu para falar sobre as experiências de vida de outra pessoa, que tão generosamente decidiu escrevê-las para que possamos ler? O Meu Pai Voava, de Tânia Ganho, reune alguns dos pensamentos, memórias e inquietações da autora aquando da morte do pai — e eu, menina do papá assumida, estive o tempo todo de coração nas mãos.

 

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Mais do que uma homenagem à figura tão querida de um pai, parece-me que estamos perante um daqueles livros que partem da necessidade de exteriorizar e fazer sentido das emoções que nos atacam em momentos tão difíceis quanto este. Um lado egoísta meu fica feliz por as palavras e a escrita terem feito parte do processo de catarse da Tânia, porque assim posso, através dos pensamentos dela, preparar-me para uma das inevitabilidades desta vida.

 

Compreendi porque é que nos filmes as pessoas se deitam ao lado dos mortos, se atiram para dentro da sepultura aberta. Por instantes, era isso que eu queria, abrir o caixão e estender-me ao lado do meu pai, pedir-lhe um último abraço. E ficar assim durante horas, na quietude à luz das velas, sem ninguém, só nós os dois. Havia todo um mundo que se encerrava naquele dia e eu precisava do meu pai para enfrentar o resto da vida. Era como se, deixando de ser a menina do papá, fosse obrigada a crescer, a ser adulta, e eu não queria ser adulta. Já o era há muitos anos, e já o perdera há muito tempo, mas a finitude do caixão, do corpo frio, de mãos entrelaçadas no peito, fez-me sentir que uma parte de mim morrera. A menina.

 

Aqui é-nos contada uma perda antecipada: este pai já estava doente, a sua morte não foi consequência de um acidente trágico e inesperado, e acredito que isso também tenha contribuído para que os registos que podemos ler em O Meu Pai Voava já nos cheguem mais amadurecidos, pensados e repensados, alguns provavelmente rabiscados vezes sem conta. Em suma: embora trate um tema muito triste, a verdade é que me parece uma das leituras mais imperdíveis dos últimos tempos — e só posso recomendar este pequeno livro.

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