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Rita da Nova

Seg | 10.09.18

Dividimos a Conta // Mafalda Beirão no Trópico do Cais

Perdi a conta às vezes em que, durante o nosso jantar no Trópico do Cais, a Mafalda falou dos amigos. “Sou uma pessoa de pessoas, das minhas pessoas”, é como ela resume a forma como gosta de estar e se dedicar àqueles de quem gosta. Talvez por este espírito, a Mafalda tenha casado tão bem com o Trópico do Cais, um espaço que é restaurante durante o dia e bar durante a noite, para que possamos ficar à conversa all night long.

 

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Acabou por acontecer exactamente isso connosco e, felizmente, a maioria das coisas que comemos eram frias. Eu sei o que vão pensar: se juntam duas bloggers à mesa, elas vão deixar que a comida arrefeça por causa das inúmeras fotografias que vão querer tirar. Lamento desiludir-vos, mas não. Durante as quatro horas em que estivemos sentadas ao balcão do Trópico do Cais, raras foram as vezes em que alguma de nós pegou no telemóvel.


Nunca estive com a Mafalda num contexto que não estivesse relacionado com a comida. Conhecemo-nos quando ambas fomos entrevistadas para o Público, onde falámos da utilização que damos à plataforma Zomato, e depois disso encontrámo-nos invariavelmente em brunches por Lisboa. Achei que seria fácil manter a conversa só sobre o tema da comida, mas a coisa naturalmente resvalou para o amor, os gatos e a profissão que temos em comum - ambas trabalhamos em agências de comunicação/marketing.

 

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Quando chegaram as Gyosas, percebemos que tínhamos mais uma coisa em comum - a mania das texturas. Estas estavam crocantes e óptimas para ambas, mas rapidamente começámos a listar coisas que aprendemos a comer já em crescidas, porque em crianças nos faziam confusão. A Mafalda disse logo que as lulas e os figos são o caso mais flagrante de algo que ela teve de aprender a gostar. “Ainda no outro dia, estava com amigos, e revelei-lhes que só tinha experimentado figos há dois anos”. Daí às comparações do aspecto desta fruta com o Demogorgon de Stranger Things foi só um passinho.

 

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Ainda bem que, no meio desta conversa sobre texturas, a Mafalda disse que gostava muito de salmão cru, já que logo a seguiu chegou um Tártaro de Salmão à mesa (perdão, ao balcão). Como eu tenho uma relação muito emocional com este peixe, aproveitei para lhe perguntar qual a sua primeira memória relacionada com a comida. “O facto de não gostar de comer carne de vaca. Lembro-me de estar sentada à mesa da primeira casa dos meus pais e pensar que comer carne é um sacrifício. É engraçado que a minha primeira memória seja de uma coisa que eu não gosto.”

 

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Ainda hoje lhe é complicado comer carne vermelha e, progressivamente, sente que tem enjoado de frango e perú. Talvez por isso o Tártaro de Novilho não tenha feito grande sucesso (apesar de vir servido com amendoins e um creme de queijo da ilha, que salvaram o prato para ela). Já os Camarões Salteados e o Tataki de Atum (o meu favorito da noite) desapareceram ao ritmo da conversa.

 

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É interessante perceber que as pessoas têm tipos de fome diferentes e que o da Mafalda é essencialmente sensorial. “Se eu vejo um anúncio sobre batatas fritas, eu não descanso até comer batatas fritas”. É claro que ajuda o facto de as batatas fritas serem o seu soft spot, mas é-lhe difícil resistir quando vê ou cheira algo de que gosta muito. A cena da Mafalda são os salgados e, aqui, já não concordamos tanto - eu sou team doces.

 

Foi a deixa perfeita para lhe fazer uma pergunta que adoro - e que costumo fazer como exercício de apresentação nos meus workshops de Escrita Criativa: imagina que morres daqui a pouco, mas tens direito a uma refeição completa (entrada, prato principal, sobremesa e bebida). O que escolherias? A Mafalda pensou bastante antes de escolher cada uma das componentes desta refeição, mas não hesitou em dizer “a sopa da minha mãe como entrada”. Estão a ver aquelas sopas das mães/avós, cuja receita seguimos à risca, mas nunca ficam iguais? Essas mesmo.

 

A pizza de trufa do In Bocca al Lupo seria o prato principal. Aqui fizemos uma pausa de aproximadamente meia hora para divagarmos sobre o quão maravilhosas são as trufas e quais os melhores pratos com este ingrediente, que é daqueles que vale cada cêntimo (suck it, caviar!). A Mafalda diz que há coisas em que é assumidamente criança e, por isso, não poderia escolher outra bebida que não groselha. Mas a parte mais divertida foi mesmo ver a luta interna dela, em busca de uma sobremesa que valesse a pena comer mesmo antes de morrer. Talvez uma pannacotta, talvez uma serradura, mas nenhuma sobremesa a encanta por aí além (COMO ASSIM, MAFALDA?!).

 

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Quem conhece e acompanha a Mafalda, sabe que ela não existe sem duas coisas: música e Nova Iorque. E não deixa de ser curioso perceber que ambas têm uma relação interessante com a comida. A música porque é, na maioria das vezes, a companhia perfeita enquanto prepara jantares para receber amigos em casa. Nova Iorque porque - embora as viagens a Marrocos e Colômbia a tenham marcado mais em termos gastronómicos -  é um paraíso para food lovers.

 

Inevitavelmente, imagino-a a passear por Manhattan de phones nos ouvidos, a caminho de um sítio novo para fazer brunch que, muito possivelmente, descobriu no Instagram. É assim que encontra os sítios que vale a pena conhecer, tanto em viagem como em Lisboa. É verdade que a nossa capital está ao rubro, com restaurantes e cafés novos a abrir a cada segundo. Ainda assim, hoje em dia a Mafalda prefere repetir aqueles que compensam uma hora de espera do que arriscar em sítios que facilmente desiludem. E como eu sei que vão querer saber, esses sítios são: Fauna & Flora, Heim CaféThe Mill e, a mais recente descoberta, o Café Janis.

 

A sobremesa chegou. Eu fiquei feliz, a Mafalda não tanto. Mas a Delícia de Chocolate com Crumble surpreendeu bastante, mais que não seja porque não vem com um crumble qualquer. Veio cheio de petazetas, pessoas. O que há aqui para não gostar?

 

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Mas onde este jantar ganhou a Mafalda foi mesmo na supresa final, quando veio uma taça de Açaí para a mesa. Eu explico: no início do jantar, eu perguntei à Mafalda que prato tenho que comer para sentir que a conheço. E ela respondeu que tem de ser qualquer coisa que se serve numa taça, como uma sopa ou um açaí. “Quando me apetece uma coisa aconchegante, quentinha, o que eu penso logo é numa bowl por exemplo com quinoa, com espinafres, com cogumelos. Simboliza aquele quentinho que eu gosto de dar às pessoas, torná-las minhas, mas ao mesmo tempo é aquilo que me faz feliz comer.”

 

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Precisaria de muito mais espaço e tempo para recordar todos os temas sobre os quais falámos, desde as intolerâncias alimentares até ao Whole30, passando pela irritação que ela sente quando pessoas ao lado dela fazem barulho a comer. Para conhecerem melhor a Mafalda, é acompanhá-la no Malmequer (o blog) e no Instagram. Para passarem um óptimo momento com ela, é convidá-la para almoçar ou jantar. Pode ser que ela aceite.

 

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Isto ou aquilo? 

1. Refeição favorita? Pequeno-almoço.

2. Cozinhar ou comer fora? Cozinhar para os meus amigos.

3. Um restaurante de sempre? Boa-Bao.

4. Uma moda gastronómica de que até gostas? Açaí.

5. Algo que cozinhas especialmente bem? Bolo de três chocolates.

6. Uma alergia? “Só” intolerâncias.

7. Chá ou café? Chá.

8. Uma comida do mundo? Pad thai.

9. Um restaurante que querias que se mantivesse segredo? Boa-Bao.

10. Dividir a conta ou cada um paga o que comeu? Dividir a conta.

 

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Este post faz parte da rubrica Dividimos a Conta. Todos os meses convido uma pessoa para almoçar ou jantar fora em restaurantes Zomato Gold, para conversarmos sobre a sua relação com a comida. O que gosta, o que não gosta, o que aprendeu a gostar, mas manias, as receitas de família… enfim, o que surgir. 

 

[Todas as fotografias deste post são da autoria da Margarida Pestana.] 

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