Aquilo Que o Sono Esconde, Mafalda Santos
A Mafalda Santos conseguiu, mais uma vez, por-me a questionar a minha sanidade mental com aquilo que escreve. E se isso não é o maior elogio que se pode fazer a quem escreve dentro das distopias e da ficção especulativa, então não sei. A cada livro publicado, sinto que vai mais fundo neste esbatimento dos limites entre a consciência humana e os mundos que cria — e é isso mesmo que podem esperar em Aquilo Que o Sono Esconde, o seu mais recente lançamento.
Começamos por conhecer Jaime, um homem aparentemente normal, que trabalha numa seguradora, e que se especializou em processos de acidentes de viação. Só que Jaime não é um protagonista «normal»: desde o primeiro momento, percebemos que é um homem detestável, tão focado no lucro da empresa para que trabalha que o seu grande propósito é o de impedir indemnizações. É durante um desses processos que a narrativa começa: uma mulher tem direito a uma soma avultada após sofrer um acidente que a deixa incapacitada, mas Jaime não quer que isso aconteça.
Após uma festa de Natal da empresa, começam a acontecer-lhe coisas estranhas: dá por si num baile de máscaras que não tem a certeza se viveu ou imaginou, e percebe que perdeu a capacidade de dormir. Nas páginas seguintes, e a cada cena, a autora leva o leitor a questionar-se constantemente: isto é privação de sono, o mundo dos sonhos ou a realidade da narrativa? E assim sucessivamente, até percebermos o que realmente se está a passar.
Estava muitíssimo curiosa com este livro, e acho que a Mafalda conseguiu surpreender-me mais uma vez. Aqui, ao contrário dos outros livros dela que li, não tanto pela construção deste enredo (até porque isso já era ponto assente em Do Outro Lado e Enquanto o Fim Não Vem), mas pela investigação sobre o sono que foi necessária para que tudo isto fizesse sentido. Se gostam de livros com premissas originais e desenvolvimentos coesos, embora estranhos, então este é uma excelente escolha para vocês!
Há por aí leitores da Mafalda?