O Ano da Morte de Ricardo Reis, José Saramago
Neste meu ano a tentar ao máximo ler os livros que já tenho cá por casa, José Saramago tem aparecido quase mensalmente nas minhas leituras — e faz bastante sentido, se considerarmos a sua extensa obra e o facto de eu ter pouquíssimo autocontrolo quando apanho um livro do autor com o mínimo de desconto. Ainda assim, num misto de preguiça e receio de não gostar, demorei bastante a pegar em O Ano da Morte de Ricardo de Reis.

As referências a Fernando Pessoa não se ficam só pelo título e, ao longo da leitura, lembrei-me muito da minha professora de Português do 12.º ano por ser uma apaixonada pelo poeta, e por nos ter endoutrinado muito além do que o currículo escolar pedia. Fomos a peças de teatro e a exposições, lemos livros sobre Fernando Pessoa além dos dele, conversámos sobre o que poderia ser a vida pessoal deste homem tão fascinante. Por isso, ler este livro de Saramago foi um pouco como voltar a essa altura em que, através de alguém, também eu me apaixonei um pouco pela poesia pessoana.
Abrindo um pouco o jogo sobre a história deste livro, podemos dizer que começa mesmo à Saramago: pegamos na realidade e acrescentamos-lhe um «e se?» qualquer, que leva a narrativa para lugares onde não iria caso nos cingíssemos aos factos concretos. Acompanhamos então Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa, no seu regresso do Rio de Janeiro no final de 1935, depois da morte de Fernando Pessoa — e, mais especificamente, o momento em que o heterónimo se encontra com o fantasma de Pessoa.
Não sei porque adiei esta leitura durante tanto tempo, bastou-me começar para compreender que tinha tudo aquilo de que gosto em Saramago: uma premissa original, uma crítica política e social mordaz, diálogos tão reais que não poderiam ser inventados. E, especificamente em O Ano da Morte de Ricardo de Reis, existe ainda uma certa intertextualidade, no sentido em que são mencionados vários outros textos canónicos da Literatura portuguesa — também essas referências em jeito de sátira, como lhe era habitual.
Adorei esta experiência de leitura, e acredito que o formato em que li contribuiu muito para esta minha opinião, visto que alternei o livro físico com a versão audiolivro. Temos excelentes narradores, e fiquei agradavelmente surpreendida por ver que a Mafalda Santos emprestou a sua incrível voz às mulheres deste livro. Quando ouvia era como se estivesse a ver uma peça de teatro, pelo que recomendo vivamente Saramago também neste formato.
Quais são os vossos livros favoritos de José Saramago?