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Rita da Nova

Ter | 18.03.25

Coisas de Loucos, Catarina Gomes

Não há ninguém que leia Coisas de Loucos, de Catarina Gomes, e que não fique completamente fascinado com este livro — de tal modo que eu tinha algum medo antes de começar, não fosse não corresponder às expectativas demasiado elevadas. Mas agora que o li, e que ficou como um dos favoritos do ano até agora, tenho a certeza de que corresponderia sempre, mesmo que a bitola estivesse altíssima.

 

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Para quem nunca ouviu falar, Coisas de Loucos parte de uma investigação jornalística de Catarina Gomes, que se foi dedicando a acompanhar o processo de encerramento do Miguel Bombarda, um hospital psiquiátrico muito conhecido na cidade de Lisboa. Ao início, o objetivo era fazer uma peça sobre pessoas famosas que lá estiveram internadas, mas, no meio de uma visita ao espaço, a autora encontrou uma caixa perdida, cheia de objetos sem donos. A ideia de traçar um perfil desses desconhecidos através das coisas que deixaram para trás pareceu-lhe muitíssimo mais interessante — e este livro é o resultado dessa investigação de anos.

 

Ao ir atrás da história destas pessoas, a maior parte delas esquecidas pelas famílias naquela instituição, a Catarina fez-lhes justiça: deu-lhes um nome, um passado, uma personalidade. Fez-me pensar muito no anonimato a que condenamos as pessoas que sofrem de doença mental, sobretudo as que acabam por ser internadas em hospitais psiquiátricos para nunca mais saírem. Claro que a forma como tratamos estes pacientes é, hoje em dia, muito mais humana do que era no tempo do Miguel Bombarda e nas décadas anteriores; ainda assim, torna-se inevitável pensar nas condições de vida que damos a estas pessoas.

 

Há muito tempo que não lia nada escrito com tanta empatia e cuidado, sem deixar de pôr o dedo na ferida quando assim tem de ser. Fico muito feliz que a Leopoldina, o Noé, o Simão, o Manuel, o Valentim, o Clemente, o Ricardo e o Jaime tenham aqui uma última oportunidade de ver a sua história contada, longe do apagamento a que quase todos foram sujeitos. Se puder deixar-vos a recomendação, só posso dizer o seguinte: leiam, não se vão arrepender.

 

Alguém desse lado já leu Furriel não é nome de pai, da mesma autora? Se sim, aconselham?