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Rita da Nova

Qui | 20.02.25

Get a Life, Chloe Brown, Talia Hibbert

Há algum tempo comprei todos os livros da saga Brown Sisters, de Talie Hibbert, para ter no Kobo sempre que precisasse de uma leitura mais leve. Get a Life, Chloe Brown (PT: Acorda Para a Vida, Chloe Brown) é o primeiro, que já tinha começado a ler em tempos, mas depois parei porque não me estava a entusiasmar na altura. Ainda assim, motivada pelas reviews positivas que fui apanhando sobre os livros da autora, decidi dar-lhe uma oportunidade em formato audiolivro.

 

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Chloe sofre de fibromialgia e quer mostrar a toda a gente que ter uma doença crónica não significa que seja dependente dos outros. Isso faz com que, em muitas coisas, seja demasiado séria — as irmãs estão sempre a dizer-lhe que tem de relaxar. Chloe decide, então, fazer uma lista de coisas que a ajudarão a «acordar para a vida». No meio de tudo isso, cruza-se com Red, que «espia» de vez em quando e que lhe parece a pessoa perfeita para a ajudar a levar-se menos a sério.

 

Começando pelas coisas de que gostei: sem dúvida que a representatividade de pessoas com doença crónica foi o ponto mais positivo do livro para mim. Pareceu-me que foi bem explorada e que, acima de tudo, a construção de Chloe enquanto personagem faz todo o sentido; imagino que uma pessoa que tenha necessidade de provar a sua independência acabe por ver a vida com as lentes da seriedade. E apesar de ter apreciado a escrita de Talia Hibbert, a forma como o livro se desenvolveu, bem como a relação de Chloe e Red, soaram-me bastante apatetadas — achei que não condiziam com o resto. Acredito que a narradora do audiolivro, ao contrário do que costuma acontecer, não tenha ajudado a esta minha sensação. O tom de voz que empregava fazia parecer que os protagonistas eram adolescentes e não duas pessoas quase na casa dos 30.

 

Embora não tenha ficado especialmente impressionada com este livro, ainda mantenho uma réstia de curiosidade em relação aos restantes livros da série; e talvez experimente ler em vez de ouvir, idealmente numa altura em que precise de qualquer coisa mais leve. Já os leram? Se sim, acham que vale a pena continuar? Contem-me tudo nos comentários!

Ter | 18.02.25

Conta-me Tudo Outra Vez, Maria Bravo

Conta-me Tudo Outra Vez já me tinha piscado o olho ainda antes de a Maria fazer parte do Clube das Mulheres Escritoras. Depois ela juntou-se, vi que o livro estava disponível no Kobo Plus e achei que estavam reunidas as condições para não deixar passar do início deste ano. Não sabia bem o que esperar da história, tinha apenas presente que era um livro contado alternadamente entre um pai e uma filha — e pareceu-me um bom ponto de partida.

 

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Francisca está quase a acabar o ensino secundário, altura em que fará um Interrail com as amigas. É uma rapariga em tudo normal, e tem de fazer por equilibrar a vida social com os estudos. Vive longe do pai desde que é muito pequena, como consequência de um divórcio, mas Rodrigo está sempre presente, mais que não seja em forma de carta ou recadinhos deixados aqui e ali. Durante metade do livro, vamos conhecendo as suas vidas, rotinas e passados — confesso que foi demasiado contexto para mim enquanto leitora, mas acredito que quem gosta de saber tudo sobre as personagens vá apreciar.

 

A segunda metade da história foi, sem dúvida, aquela a que consegui ligar-me mais. Li-a num sopro, cheia de vontade de saber o que estava prestes a acontecer a esta filha e a este pai. A sinopse diz que há um «acontecimento para que nenhum dos dois estava preparado», e eu tive suspeitas do que seria, mas mesmo assim teve impacto — gostei muito de ver como a autora explorou este lado mais maduro e duro da história destas duas personagens. O meu lado que adora histórias tristes não me deixa terminar esta review sem dizer que teria preferido que a história fosse mais como esta segunda metade, mesmo que para isso perdêssemos algum contexto sobre Francisca e Rodrigo.

 

A escrita é irrepreensível e muito direitinha, não fosse a Maria uma das melhores revisoras que conheço, e parece-me que é uma leitura acertada tanto para uma faixa etária mais jovem, que está a começar a ter hábitos de leitura, como para leitores mais «crescidos» em todos os sentidos. E vocês, já tinham visto este livro por aí? Eu ficarei deste lado à espera de ver o que a escritora ainda tem para mostrar ao mundo!

Sex | 14.02.25

Revolutionary Road, Richard Yates

Encontrei um exemplar em segunda mão de Revolutionary Road, de Richard Yates, numa livraria em Nova Iorque. Sabendo que era um daqueles livros que desperta curiosidade, mas não imensa, achei que fazia sentido gastar menos dinheiro numa cópia. Depois, como vários livros que cá vêm parar a casa, foi ficando na prateleira até que me decidisse finalmente a lê-lo.

 

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Frank e April são um casal aparentemente feliz. Nos Estados Unidos dos anos 1950, vivem aquilo que poderia ser considerado «o sonho americano». Têm dois filhos saudáveis, uma boa casa nos subúrbios e Frank parece ter um emprego estável. Por detrás desta aparente vida próspera, porém, começamos a compreender que talvez Frank e April sejam afinal profundamente miseráveis. Frank odeia o trabalho que tem, April detesta a ideia de ser dona de casa, mas ambos permanecem porque acham sempre que algo melhor estará por vir. Mas será que está mesmo?

 

Gostei muito da forma como Richard Yates descasca este casamento, camada atrás de camada, para nos mostrar quem realmente são estas personagens e quais as suas verdadeiras ambições. Senti-me sempre como se não fosse suposto estar a ter acesso à vida privada do casal, como se tivesse uma vista privilegiada para os seus segredos — e a minha veia de «cusca» adorou ir percebendo tudo à medida que a história se desenrolava. Acho que as personagens estão bastante bem construídas, até as secundárias. Aliás, acho que este conjunto de pessoas deu uma substância grande à história, que poderia ter sido mais aborrecida caso ficasse exclusivamente presa no casal.

 

He couldn't even tell whether he was angry or contrite, whether it was forgiveness he wanted or the power to forgive.

 

A escrita é muito atual, quase que dá impressão de que Revolutionary Road poderia ter sido escrito nos dias de hoje. Não sei como estará a tradução para português (está publicado com o mesmo título), mas acredito que seja bastante competente. Pareceu-me um daqueles livros bastante universais e intemporais, tanto pela forma como pelo conteúdo, pelo que fica a recomendação caso vos apeteça ler sobre um casamento em crise. Já experimentaram mais algum livro do autor? Se sim, recomendam?

Qui | 13.02.25

Maus Hábitos, Alana S. Portero

Há muito tempo que andava com Maus Hábitos, de Alana S. Portero, debaixo de olho. Não sabia bem porquê, mas qualquer coisa neste livro me atraía e dizia que iria gostar muito de o ler. Achei que não havia melhor altura do que o início de um novo ano para, finalmente, avançar com esta leitura e posso concluir que foi tudo o que eu antecipava e ainda mais.

 

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A protagonista deste livro nasceu num corpo masculino, que sabe não lhe pertencer desde muito cedo. Além de nascer num corpo errado, nasce também num bairro operário em San Blas, nos arredores da Madrid dos anos 1980/90, um lugar onde sente não haver futuro nem possibilidade de se afirmar como realmente é. Aos poucos, porém, vai encontrando algumas pessoas com quem se identifica, pessoas que são um pouco como ela — pessoas que resistem à norma. A adolescência leva-a a explorar o centro da cidade, os bares onde há mais pessoas como ela, onde há pessoas diferentes daquelas que conhecia no bairro.

 

Tinha aprendido muito com ela, com elas, eram o primeiro conciliábulo de mulheres a que pertencia, sem distâncias, sem esconderijos. Teria gostado de influenciar do mesmo modo as suas vidas, para que a troca fosse justa, mas junto delas compreendi que as filhas estão sempre em dívida, que não conseguimos devolver o que nos é dado ou aquilo com que ficamos porque não é natural fazê-lo. A nossa missão é passar a outras o que recebemos, quem quer que elas sejam. Aprendi que a genealogia, sendo um amor herdado, só funciona em cascata.

 

Maus Hábitos é, acima de tudo, uma história sobre esta procura incessante por uma sensação de pertença, principalmente numa altura e num sítio onde a diferença não parecia ter espaço. Adorei conhecer esta protagonista e o bairro através dela, porque é tudo escrito com uma enorme empatia e compreensão da complexidade humana. Cada pessoa que nos é apresentada acrescenta algo à vida da personagem principal e à trama do livro, pelo que posso afirmar que não senti uma palavra ou pormenor a mais ao longo do livro.

 

Apesar de ser um livro extremamente duro, já que aborda temas como o abuso de drogas, a violência, a prostituição e a transfobia, a verdade é que também há sempre um subtexto que nos remete para a esperança, para a necessidade de encontrar algo de bom no meio das desgraças que nos vão sendo mostradas, e que mais não são do que o «estado normal» das coisas naquele bairro. Adorei tudo, e gostei especialmente da forma como termina — é quase que o fechar de um ciclo que nos permite imaginar as coisas boas que aconteceram depois.

 

Recomendo imenso este livro, ficará certamente como um dos meus favoritos deste ano e como uma recomendação que farei várias vezes, a vários tipos de leitores diferentes. Se também têm curiosidade e ainda estão na dúvida, digo apenas: leiam.