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Rita da Nova

Qui | 06.02.25

A Cidade e as Serras, Eça de Queirós

É verdade, é verdade: nem sempre se encontram reviews sobre clássicos da literatura neste blog, mas este é um daqueles momentos em que vos surpreendo. Faço parte do grupo de pessoas que não só leu Os Maias na escola, como gostou da leitura. Por isso mesmo, poucos anos depois, decidi experimentar outras obras do Eça e comecei por esta, A Cidade e as Serras, mas não consegui passar das primeiras páginas. Agora, vários anos volvidos e numa tentativa de ler tudo o que tenho cá em casa, dei-lhe uma nova oportunidade e adorei.

 

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Há mesmo alturas certas para lermos os livros, e eu acho que a leitora que sou hoje conseguiu apreciar muito melhor este livro. A Cidade e as Serras foi publicado postumamente, e foi o último livro do autor, e tem até a nota de que os últimos capítulos não chegaram a ser editados como ele gostaria. Compreendo, mas não creio que tenha estragado a experiência ou o resultado final. Conta a história de dois amigos: José Fernandes, que mora em Tormes, e Jacinto, que mora em Paris. Quando José Fernandes visita o amigo na capital, espera encontrá-lo rodeado da felicidade que só a tecnologia e o progresso podem proporcionar. Contudo, rapidamente percebe que Jacinto é profundamente infeliz, apesar de ter todas as condições consideradas ideais. Decidem ir os dois para Tormes e, surpreendentemente, é no contacto com a natureza e com uma vida mais simples que Jacinto consegue encontrar a tranquilidade de que precisa.

 

Ultrapassada alguma dificuldade inicial em entrar no registo e na escrita do autor — dada a lentidão com que começa —, senti-me a aproveitar a dinâmica entre estes dois amigos. A escrita é aquilo a que Eça de Queirós sempre nos habituou, mas a verdade é que já não me recordava que era tão atual. Gostei muito de relembrar que, apesar de ter sido escrito há mais de cem anos, é perfeitamente possível lê-lo sem qualquer dificuldade. E, claro, não podia deixar de referir a crítica social, que está sempre presente nas obras do autor. E não consigo não deixar aqui um pensamento que me passou várias vezes pela cabeça enquanto lia: deu-me sempre a sensação de que havia um certo homoerotismo velado nas interações entre José Fernandes e Jacinto — fui só eu?

 

Fico mesmo feliz por ter dado uma nova oportunidade a este livro, e por a experiência ter sido infinitamente superior à primeira. Se gostariam de voltar aos clássicos portugueses, aqui fica esta recomendação — acho que pode ser um bom sítio para (re)começar. Têm outras sugestões dentro deste género?