Comprei este livro na minha última viagem a Nova Iorque, sem saber muito bem de que se tratava — acho que já o tinha visto por aí, sabia que era young adult, mas de resto fui completamente às escuras. Foi ficando cá por casa, passaram dois anos, mas, para ganhar alguma vergonha na cara, decidi escolhê-lo para o Clube do Livra-te de junho. Apesar de ter estado muito tempo por ler cá em casa, posso desde já dizer que foi uma agradável surpresa e que devia ter pegado nele mais cedo.
Girl in Pieces (PT: Rapariga em Pedaços), de Kathleen Glasgow, conta a história de Charlie, uma jovem de dezassete anos que já perdeu muita coisa na vida: o pai, a melhor amiga, a mãe. No meio da incapacidade de lidar com tudo isto, a única coisa que apazigua a dor é inflingir uma dor física provocada por cortes no corpo. Começamos o livro no momento em que Charlie dá entrada numa espécie de asilo, e vamos sempre acompanhando — na primeira pessoa — a forma como esta rapariga tenta sobreviver a tudo aquilo que sente.
Everyone has that moment I think, the moment when something so momentous happens that it rips your very being into small pieces. And then you have to stop. For a long time, you gather your pieces. And it takes such a very long time, not to fit them back together, but to assemble them in a new way, not necessarily a better way. More, a way you can live with until you know for certain that this piece should go there, and that one there.
Embora seja categorizado como young adult, achei que o livro era muito mais forte do que eu estava à espera: a escrita é honesta e dura quando tem de ser, com descrições de mutilação, mas também de abuso de drogas e álcool. Ou seja, não é uma leitura leve, nem fácil, e acredito que seja preciso estar na disposição certa para o ler e para o apreciar. Ainda assim, acredito que qualquer pessoa consiga empatizar com a Charlie e todas as outras personagens que estão em fases muito complicadas das suas vidas, mesmo que nem sempre tomem as melhores decisões.
É um livro perfeito em termos de narrativa e ritmo? Não achei, haveria certamente alguns pontos que poderiam ter sido explorados de forma diferente, mas honestamente acredito que é um daqueles casos em que o desenvolvimento de personagens e a temática estão lá — e isso é o mais importante nesta história. Quem desse lado já leu?
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O que é o Clube do Livra-te?
É o clube do livro do podcast Livra-te — calma, não precisam de acompanhar o podcast para participar nas leituras. Todos os meses, cada uma de nós escolhe um livro para ler em conjunto convosco e vocês podem optar por ler a escolha da Joana, a escolha da Rita ou ambas. Depois, podem deixar a vossa opinião no grupo do Goodreads ou no Discord. Podem juntar-se a qualquer altura, venham daí!
Já li este livro há algumas semanas, mas ainda não consegui decidir o que achei sobre ele. The Rachel Incident (Um Incidente Chamado Rachel), de Caroline O'Donoghue, chegou-me à lista de leituras do mês por ser a escolha da Joana para o Clube do Livra-te e sabia pouco sobre a história antes de começar, pelo que parti sem expectativas para a leitura.
Em The Rachel Incident conhecemos Rachel, a protagonista, em dois momentos diferentes: no início do livro já está na casa dos trinta, mas a notícia da doença de Dr. Fred Byrne, que foi seu professor, fá-la recordar os acontecimentos de alguns anos antes. É então que somos transportados para a altura em que Rachel e James ficam amigos, vão morar juntos e vivem uma vida boémia — até ao momento em que Rachel começa a apaixonar-se por este professor que, mesmo não tendo interesse nela, acaba a ligar-se àqueles dois amigos por outros motivos. Rachel, James, Fred e a sua mulher desenvolvem uma série de dinâmicas entre si que resultam em segredos e consequências sérias na vida de todos.
É um livro muito irlandês, com personagens complexas e reais, que nem sempre são boas pessoas. Gostei bastante disso neste livro, do facto de a Rachel e o James de 21 anos serem egoístas e acabarem a tomar decisões com base no que era melhor apenas para eles, sem considerarem o contexto e as consequências para os outros. Ainda assim, sinto que não teve força suficiente para ser tão marcante como eu esperaria que fosse tendo em conta toda esta carga humana. Na realidade, ainda não sei bem o que me faz achar isto, mas sei que houve partes da história que poderiam ter sido muito mais desenvolvidas para dar profundidade a estas personagens — porque mesmo quando temos vinte anos e somos irresponsáveis, há espaço para dilemas e conflitos interiores que eu não senti que fossem tão bem explorados assim no livro. Por exemplo (e agora vem um mini-spoiler): quando falamos do aborto e da forma como isso é socialmente encarado na Irlanda, gostava que a autora não tivesse optado pela forma mais fácil de tirar o problema da equação.
O único ponto que eu sabia da história era que desenvolvia a amizade entre James e Rachel e, nisso, senti-me completamente defraudada. Em ponto algum achei que o James gostava da Rachel, senti sempre que se estava a aproveitar dela. Fascínio? Amizade unilateral? Talvez. Mas a parte da amizade real passou-me completamente ao lado.
De qualquer das formas, é uma leitura interessante e envolvente — só não vai ficar comigo durante tanto tempo como poderia. E vocês, já o leram? Se sim, o que acharam?
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O que é o Clube do Livra-te?
É o clube do livro do podcast Livra-te — calma, não precisam de acompanhar o podcast para participar nas leituras. Todos os meses, cada uma de nós escolhe um livro para ler em conjunto convosco e vocês podem optar por ler a escolha da Joana, a escolha da Rita ou ambas. Depois, podem deixar a vossa opinião no grupo do Goodreads ou no Discord. Podem juntar-se a qualquer altura, venham daí!
Tive a sorte de ser uma das primeiras pessoas a receber Admirável Mundo Verde, o novo livro da Filipa Fonseca Silva. Por fazer parte do Clube das Mulheres Escritoras também vou acompanhando os processos de escrita das minhas companheiras de ofício e já há muito tempo que estava curiosa com esta história, já que é a primeira vez que a Filipa se lança para fora de pé e escreve um livro que pode ser considerado uma distopia.
Em Admirável Mundo Verde, assim chamado em jeito de homenagem a Aldous Huxley, acompanhamos um grupo de ativistas pelo clima que se radicaliza e toma medidas extremas para derrubar o Governo. A história anda à volta de Billie, Max e Laura, três amigos que, a certo ponto, fizeram parte destas Brigadas Verdes, mas que acabaram por ter destinos diferentes aquando do golpe de Estado. A Billie acaba a servir de fio condutor da narrativa e faz um apanhado dos efeitos da radicalização das Brigadas Verdes, tanto a um nível social como a um nível bastante pessoal, uma vez que Laura é a cara do novo sistema instaurado.
Gostei muito da forma como a Filipa construiu este universo não tão longínquo assim, e senti que a sua escrita é perfeita para histórias com um tom mais distópico e sombrio. Quando estive no evento de apresentação deste livro a um pequeno grupo de criadores de conteúdo (obrigada 🥹), a Filipa disse que é ambientalista desde muito pequena e que inclusivamente sofre de eco-ansiedade, mas não pensem que este livro é moralista e que se fica apenas pela descrição de toda a emergência climática que estamos a viver. Vai mais longe e lança-nos a questão para uma reflexão sobre o tema: vale tudo para travar a crise ambiental? Nesse sentido, quase que este livro poderia ser sobre qualquer outro assunto que polariza a nossa sociedade e sobre os extremismos para que pendemos — e gostei de perceber que este livro não é panfletário; põe-nos as cartas em cima da mesa e obriga-nos a chegar à nossa própria opinião.
Num nível mais pessoal, também senti que o facto de a Filipa arriscar num género literário onde não tinha grande experiência — apesar do medo e das dúvidas — é uma grande inspiração para o panorama editorial português. Ela reinventa-se constantemente e tem uma postura tão humilde em relação a tudo o que faz, que é impossível não admirar as coisas que escreve, mesmo que algumas das histórias nos digam mais do que outras.
Vale muito a pena pegar neste Admirável Mundo Verde, que além de tudo o que disse acima é um livro cheio de ação e — acreditem em mim — não vão conseguir parar enquanto não souberem como termina. Ficaram com curiosidade?
Não é novidade para ninguém que planeio ler todos os livros de Taylor Jenkins Reid, e a review que vos trago hoje tem precisamente que ver com isso: vi há uns tempos um TikTok em que a criadora de conteúdos classificava todas as obras publicadas pela autora e mencionava uma que eu nunca tinha ouvido falar antes — The Evidence of the Affair. Percebi depois que se trata de um conto, que decidi ler numa altura em que precisava de um fôlego entre livros maiores e… adorei.
Esta história é toda escrita em forma de cartas entre uma mulher e um homem, Carrie e David, que não se conhecem. É Carrie quem começa esta correspondência depois de descobrir que o marido estava a ter um caso com a mulher de David. Cada um deles vai contribuindo com o seu ponto de vista — com o que sabem e com o que observam — para desenhar os contornos desta traição, e dão por si a partilhar coisas que não partilhariam com mais ninguém.
You asked how I hide it all. I don’t know. I guess I find it pretty easy to look like nothing is happening when everything has changed.
A escrita da Taylor Jenkins Reid é sempre envolvente e gostei muito de a ler neste registo epistolar, e senti que, apesar de serem apenas cartas, a autora conseguiu tornar a história muito visual. Aliás, The Evidence of the Affair lembrou-me muito uma série que adorei, chamada Love & Death, embora o conto seja apenas sobre amor e não tenha nada de true crime como a série. No fundo, é uma pequena história sobre o que leva alguém a trair e o que leva alguém a ficar, mesmo sabendo do que se está a passar.
Recomendo muito esta leitura porque é rápida, mas muitíssimo envolvente. Sinto que, em tão poucas páginas, Taylor Jenkins Reid conseguiu criar duas personagens muito reais — e que vão ficar comigo durante bastante tempo. E vocês, já leram este conto?