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Rita da Nova

Ter | 30.01.24

Good Material, Dolly Alderton

Fiquei muito contente quando soube que Dolly Alderton iria regressar à ficção depois de Ghosts (PT: Estás Aí?) porque gostei muito de a ler neste registo e achei que tinha muita margem de progressão. Comprei Good Material numa das minhas mais recentes idas a Londres e estava louca por começar e, como já tinha lido opiniões menos positivas, sinto que calibrei muito bem as minhas expectativas.

 

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A primeira surpresa foi o facto de este livro ser todo contado, na primeira pessoa, através da perspetiva de um homem. Andy e Jen acabaram uma relação e, agora, ele não sabe o que fazer. Tem de sair da casa que ambos partilhavam, a carreira na comédia não lhe corre bem e os amigos não parecem compreender aquilo por que está a passar. E nós vamos acompanhando a maneira como o protagonista tenta refazer a sua vida — as decisões mais ou menos sensatas, os picos de ansiedade, o desespero por ainda se sentir apaixonado por alguém que já não quer estar mais numa relação.

 

Entrei na leitura preparada para que fosse um daqueles livros que se leem bem, mas que não mudam a vida de ninguém. Ainda assim, algum tempo depois de o ter terminado, dou por mim a pensar nele várias vezes. Creio que isso acontece porque Andy, Jen e todas as outras personagens que compõem esta história estão escritas de uma forma muito realista. Sim, fazem coisas que irritam os leitores; sim, provavelmente nós faríamos completamente diferente; sim, às vezes entram numa espiral de pensamentos negativos que parece exagerada. E eu questiono: não é isto mesmo a vida? É que nós gostamos de achar que somos muito coerentes, mas isso nem sempre é verdade.

 

No final existe ainda um capítulo narrado pela Jen, onde Dolly Alderton nos dá a outra versão dos acontecimentos. Li várias reviews e, em muitas delas, este era o ponto mais positivo do livro. Eu gostei, mas confesso que não foram estas páginas que me fizeram adorar a experiência de o ler — até porque eu conseguia perfeitamente compreender o lado dela sem que ficasse tão explícito.

 

Getting dumped is never really about getting dumped.'
'What is it about, then?' I ask.
'It's about every rejection you've ever experienced in your entire life. It's about the kids at school who called you names. And the parent who never came back. And the girls who wouldn't dance with you at the disco. And the school girlfriend who wanted to be single when she went to uni. And any criticism at work. When someone says they don't want to be with you, you feel the pain of every single one of those times in life where you felt like you weren't good enough. You live through all of it again.'

 

Não esperava, mas emocionei-me muito com este livro, sobretudo nas partes em que Andy reflete sobre o que acontece à cultura de uma relação quanto esta acaba — o que acontece às piadas que só os dois entendem, aos seus hábitos, aos seus sonhos, aos planos comuns. E gostei muito de ver a evolução do Andy enquanto homem, principalmente porque compreende o quão tóxico é dar-se com outros homens que não conseguem falar sobre os seus sentimentos de forma honesta.

 

Em resumo: é real, é honesto e tem partes mesmo muito engraçadas. Recomendo muitíssimo que o leiam, sobretudo se já acompanham o trabalho da Dolly e conhecem o tom dela. Já leram? Se sim, o que acharam?

Sex | 26.01.24

Britt-Marie Was Here, Fredrik Backman

Se tivesse de apostar, diria que Britt-Marie Was Here (PT: Britt-Marie Esteve Aqui), de Fredrik Backman, tinha tudo para se tornar um dos meus livros do coração. Afinal, Backman trouxe-me A Man Called Ove, um livro que tem um lugar especial na minha vida, bem como Anxious People — que, não sendo um favorito, foi uma boa experiência de leitura. Contudo, percebi logo de início que não ia ser tão bom quanto antecipava.

 

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Britt-Marie Was Here tem uma fórmula bastante semelhante à de A Man Called Ove: uma pessoa com dificuldade em estabelecer relações sociais vê-se obrigada a ter de se relacionar com a comunidade à sua volta. Como consequência, aprende coisas sobre si e sobre os outros que mudam a sua forma de viver. E estaria tudo bem com isso — apesar de eu não adorar perceber que os autores dependem muito destas fórmulas, consigo apreciar a história se for interessante. Pois bem, foi aí que esta falhou para mim: em momento algum me senti ligada às personagens ou ao enredo.

 

Consigo perceber que este livro é um exercício de empatia — como, aliás, são todos os do autor —, mas aqui não funcionou para mim. Ao contrário do que acontece noutros, Fredrik Backman dá-nos informações sobre Britt-Marie demasiado cedo. A personalidade estranha e até obsessiva da personagem é explicada logo aos primeiros capítulos, o que fez com que eu não sentisse necessidade de saber mais sobre ela. Além disso, achei tudo muito aborrecido, não tive vontade nenhuma de lhe pegar — só consegui terminá-lo porque optei por continuar em audiolivro enquanto limpava o abrigo de gatinhos onde sou voluntária.

 

Outra coisa que dificultou a minha ligação ao livro foi a narração na terceira pessoa. Embora este narrador saiba tudo, foi sempre escrito com uma voz demasiado colada à de Britt-Marie, de tal forma que tornou a protagonista um pouco mais irritante do que poderia ter sido.

 

Sou capaz de compreender porque é que este livro resulta com muita gente e arrisco-me a dizer que, se não tivesse lido outros do autor, teria gostado muito mais da experiência. Tem algumas ideias interessantes, mas a meu ver não foram exploradas de uma forma apelativa. Aliás, só o terminei porque era uma das escolhas do Clube do Livra-te para Janeiro, caso contrário teria dado um DNF (did not finish) com muita certeza e paz.

 

E vocês, fazem parte do grupo de pessoas que adorou este livro ou nem por isso? Contem-me tudo nos comentários!

 

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O que é o Clube do Livra-te?

É o clube do livro do podcast Livra-te — calma, não precisam de acompanhar o podcast para participar nas leituras. Todos os meses, cada uma de nós escolhe um livro para ler em conjunto convosco e vocês podem optar por ler a escolha da Joana, a escolha da Rita ou ambas. Depois, podem deixar a vossa opinião no grupo do Goodreads ou no Discord. Podem juntar-se a qualquer altura, venham daí!

Qui | 25.01.24

Maybe in Another Life, Taylor Jenkins Reid

Chega sempre aquela altura em que me apetece um livro um pouco mais leve, que me faça fugir da realidade enquanto o leio — e Taylor Jenkins Reid nunca falha nesse sentido. Uma vez que já li todos os que pertencem ao “Taylor Jenkins Reid cinematic universe” — Daisy Jones and The Six, The Seven Husbands of Evelyn Hugo, Malibu Rising e Carrie Soto is Back —, resta-me agora ir um pouco mais atrás no catálogo da autora. No ano passado li One True Loves, de que gostei, mas que não mudou a minha vida, então estava curiosa para conhecer este Maybe in Another Life.

 

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Hannah, a protagonista deste livro, tem 29 anos e não faz ideia acerca do que quer da vida. Não só passou por vários sítios como teve vários empregos, e é depois do fim de uma relação que dá por si a voltar a Los Angeles, onde cresceu. Lá, fica a dormir em casa de Gabby, a sua melhor amiga. Para celebrar o regresso, as amigas vão a um bar e encontram Ethan, um ex-namorado de Hannah, dos tempos de escola. Calma, parece muita coisa fútil, mas prometo que começa a ter mais interesse: um pouco depois da meia-noite, Gabby sugere que vão para casa, enquanto Ethan a alicia para ficar um pouco mais com ele.

 

Nesse momento, Hannah começa a avaliar as duas hipóteses: o que é que acontece se for para casa com a amiga? Ou, em alternativa, que possibilidades se podem abrir se ficar com Ethan? A partir daqui, em capítulos alternados, a autora dá-nos as duas versões. Ao início achei que poderia ser confuso, mas as duas linhas temporais são tão diferentes, que não há como baralhar. Até ao fim do livro, Taylor Jenkins Reid convida-nos a vestir a pele de Hannah e a tentar pensar qual dos caminhos seria melhor.

 

When you sit there and wish things had happened differently, you can’t just wish away the bad stuff. You have to think about all the good stuff you might lose, too. Better just to stay in the now and focus on what you can do better in the future.

 

É assumido que estes romances mais antigos da autora ainda não partilham da mesma qualidade que os mais recentes, ainda assim é certo que há qualquer coisa de muito identificativo na escrita dela. Creio que seja a maneira como cria personagens e cenários — de uma maneira tão visual, que nos transporta automaticamente para lá. Além disso, explora premissas muito interessantes, que jogam muito com os “e ses?” da vida. E aqui, até mais do que em One True Loves, conseguiu a proeza de me deixar sempre dividida em relação a que cenário seria preferível.

 

Pensei muito nas pequenas escolhas das personagens e no verdadeiro impacto que o destino pode (ou não) ter nas nossas vidas. Será que as decisões que tomamos têm mesmo impacto na maneira como as coisas se desenrolam ou, pelo contrário, tudo está predeterminado e não vale a pena estarmos a moer-nos com isso? Acredito que, se gostarem de refletir sobre estas coisas, poderão apreciar bastante a experiência de ler este livro. Além disso, adorei ver a forma como a amizade entre Hannah e Gabby constitui o centro da história, ao invés de esse protagonismo ser dado às relações amorosas.

 

Em suma: se procuram uma leitura leve, despreocupada, mas que não vos faça sentir que estão a perder tempo, então recomendo muitíssimo este livro! Creio que já só me faltam três da autora — Forever, Interrupted, Evidence of the Affair (um conto) e After I Do. Por qual me recomendariam começar?

Ter | 23.01.24

I Who Have Never Known Men, Jacqueline Harpman

Incrível como nunca tinha ouvido falar deste livro de 1995 e, de um momento para o outro, comecei a vê-lo em todo o lado. Começou aqui no blog, a propósito de distopias, e depois apareceu-me no TikTok, no Instagram e nas livrarias que visitei em Londres. Como me vinha muito bem recomendado, soube que teria de o trazer comigo.

 

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I Who Have Never Known Men, da autora belga Jacqueline Harpman, foi publicado originalmente em francês — não havendo tradução para português de Portugal, acabei por ler em inglês. Nele, acompanhamos uma jovem enclausurada juntamente com outras trinta e nove mulheres. Sabe que foi presa quando ainda era criança e por lá foi crescendo, numa cela vigiada por guardas que nunca comunicavam e que não permitiam qualquer tipo de contacto físico entre elas. Até ao dia em que, depois de soar um alarme, os guardas desaparecem e as mulheres conseguem libertar-se.

 

I was forced to acknowledge too late, much too late, that I too had loved, that I was capable of suffering, and that I was human after all.

 

Admito que a primeira parte do livro estava a ser um pouco aborrecida, mas sei que é necessária para que se estabeleçam as regras deste mundo. Nesse sentido, achei a escolha da protagonista muito interessante: ela vê tudo como nós porque, sem memórias de um tempo fora dali, descreve-nos os acontecimentos sem conhecimento prévio. Tudo mudou a partir do momento em que as mulheres conseguem sair daquela cela: a relação entre elas muda e embarcamos numa descoberta. Embora seja um livro bastante curto, consegue construir muito bem todo o cenário e dinâmica entre as personagens — é muito visual, sem ser exaustivo nas descrições.

 

Tem pensamentos muito interessantes sobre a solidão e a nossa necessidade de sermos seres sociais, de estarmos em grupo, de nos conhecermos através dos outros. Na minha cabeça, foi uma mistura da série Yellowjackets com The Handmaid’s Tale e A Alegoria da Caverna — sei que pode parecer estranho, mas acho que faz sentido!

 

Recomendo muito esta leitura, sobretudo a quem gosta de ficção especulativa. Quem já leu?

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