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Rita da Nova

Sex | 29.09.23

Ecologia, Joana Bértholo

Se eu estou naquela fase em que desato a ler tudo de uma autora que descobri recentemente? Sim. Tanto que, a meio da escrita deste post, fui encomendar mais um livro da Joana Bértholo, para não perder o embalo. Ecologia foi uma das minhas compras na Feira do Livro de Lisboa deste ano e, confesso, tinha algum receio de iniciar um livro tão extenso — mas devo dizer que, não só se lê muito bem, como é uma das histórias mais originais que me passaram pelas mãos recentemente.

 

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Quando falo de originalidade, não me refiro apenas à premissa, mas também à forma como está estruturado. O ponto de partida é o seguinte: “Numa sociedade que se fundiu com o mercado – tudo se compra, tudo se vende – começamos a pagar pelas palavras. A estranheza inicial dá lugar ao entusiasmo. Afinal, como é que falar podia permanecer gratuito?”. Nesta sociedade, em que as palavras têm um preço, tudo se altera — e a autora foi bastante exaustiva a imaginar todas as coisas que efetivamente podiam acontecer se tivéssemos de pagar pelas palavras. Senti que toda a realidade que descreve poderia ser real, que estava lá dentro a viver com aquelas personagens.

 

Nomear uma coisa é ligá-la a uma realidade e, como somos nomeados muito antes de sabermos quem somos, o nosso nome pode nunca nos representar.

 

E falando em personagens, isso leva-me a outro aspeto que achei bastante bem feito: a autora vai alternando as perspetivas das diferentes personagens e, mesmo que ao início pareça uma grande confusão, no final tudo faz sentido. Aliás, terminei a leitura a sentir que todas as 500 páginas deste livro eram necessárias para que a história fosse bem contada. Além de tudo isto, podem esperar um livro que extravasa as páginas: há QR codes e links que nos levam para fora do livro (sem nunca sairmos realmente dele), há fotografias, há excertos de outras obras — enfim, há uma série de mecanismos bastante atuais, que ajudam a construir todo o imaginário futurista e distópico de Ecologia.

 

Podia ficar aqui imenso tempo a dizer-vos que este livro é um tratado sobre a importância da linguagem e da comunicação, mas também um alerta sobre o que acontece quando tudo pode ser comercializado e privatizado. É uma leitura complexa, mas bastante fluída, que recomendo mesmo muito. Só serviu para cimentar o fascínio que tenho pela cabeça da Joana Bértholo — se partilham dessa admiração e ainda não leram este livro, de que é que estão à espera?