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Rita da Nova

Qui | 18.05.23

Our Wives Under the Sea, Julia Armfield

Our Wives Under the Sea, de Julia Armfield, é muitas vezes publicitado como sendo um livro de terror psicológico — algo que, não sendo um critério de exclusão para mim, fez com que não lhe prestasse a devida atenção. Foi só depois de algumas pessoas próximas o terem lido e me terem dito que era a minha cara, que decidi trazê-lo de Londres e começar a lê-lo logo no avião de regresso a Lisboa.

 

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E o veredicto, antes de qualquer outra coisa, é o seguinte: adorei tudo neste livro — a história, a temática e, acima de tudo, a escrita de Julia Armfield. É difícil de acreditar que este é o primeiro livro da autora, de tão polido e conciso que está. O livro conta a história de Miri e Leah, um casal que se viu separado durante meses porque o submarino que levava Leah na sua mais recente missão acabou mal. Quando Leah regressa, visivelmente abalada e com sequelas, Miri faz de tudo para compreender o que se passou, mas rapidamente percebe que há ali uma barreira que não consegue ultrapassar.

 

I want to explain her in a way that would make you love her, but the problem with this is that loving is something we all do alone and through different sets of eyes.

 

Our Wives Under the Sea é contado alternadamente entre o ponto-de-vista das duas mulheres (na primeira pessoa) e a autora fez um excelente trabalho na criação destas duas vozes tão diferentes. É certo que tem sempre aquela aura de mistério e terror psicológico, misturada com uma ficção científica mais obscura, mas sinto que isso é apenas um mecanismo para explorar uma temática mais abrangente — os efeitos da depressão nos relacionamentos.

 

O livro é bastante curto, mas Julia Armfield conseguiu a proeza de me fazer conhecer verdadeiramente aquelas duas personagens. Senti-me preocupada, emocionei-me, quis saber mais sobre o que fez com que Leah regressasse naquele estado. E, ao mesmo tempo, ajudou-me a fazer paralelismos entre situações da minha vida, a compreender melhor algumas das minhas pessoas. E eu acho que isto é o maior elogio que posso fazer a este livro.

 

Infelizmente ainda não está traduzido — e eu espero que esteja brevemente —, mas, se se sentirem confortáveis a ler em inglês, acho que é um daqueles que vale mesmo a pena. Pelo menos, deste lado, já é um dos favoritos do ano e sei que quererei reler daqui a uns tempos. Quem já tinha ouvido falar sobre ele?

Ter | 16.05.23

Pachinko, Min Jin Lee

Há livros que nos vão aparecendo um pouco por toda a parte e sabemos que, mais tarde ou mais cedo, acabaremos por lê-los — foi assim a minha relação com Pachinko, de Min Jin Lee. Como sabia que haveria de fazer parte da minha lista de leituras, fui deixando andar até que a Joana o escolheu para o Clube do Livra-te de Abril. Quase todas as reviews que fui vendo diziam que era uma história incrível, uma verdadeira saga familiar, e isso fez com que partisse para a leitura com algumas expectativas.

 

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Efectivamente, neste livro acompanhamos a mesma família coreana entre 1910 e 1989, que apanha o período histórico mais conturbado entre a Coreia do Sul e o Japão. Começamos com Sunja, que engravida de homem casado, mas opta por casar com um outro homem, que lhe oferece a oportunidade de recomeçar a vida no Japão. Este acontecimento tem a capacidade de ditar o futuro, não apenas de Sunja como de todas as gerações que se seguem, já que os membros desta família crescerão fora da Coreia e com a sensação permanente de não-pertença a lugar algum.

 

You want to see a very bad man? Make an ordinary man successful beyond his imagination. Let’s see how good he is when he can do whatever he wants.

 

Esperava uma saga familiar um pouco mais condensada em certos membros da família, mas fiquei com a sensação de que a autora quis condensar demasiado espaço temporal e demasiados acontecimentos nas cerca de 500 páginas deste livro. Isto fez com que alguns momentos fossem mais explorados em detrimento de outros — e com que o ritmo do livro fosse um pouco estranho. Pachinko está dividido em três partes e eu mantenho a posição de que poderia perfeitamente ser uma trilogia, dando tempo e espaço para que cada uma destas partes fosse mais bem desenvolvida.

 

Já o li há algumas semanas e acho que é um daqueles livros que acaba por crescer em nós depois de terminarmos, mas infelizmente não conseguiu corresponder totalmente à expectativa. Ainda assim, adorei todo o contexto histórico e cultural, e acho que a envolvência está bastante bem criada — o facto de ter estado no Japão imediatamente antes de ler este livro também fez com que me sentisse mais próxima do ambiente da narrativa, ajudando-me a compreender melhor certas coisas.

 

Resumindo: é um bom livro — não perfeito — e embora não tenha sido exactamente aquilo de que eu estava à espera, pode ser uma boa leitura para quem gosta de romances históricos ou para quem quer aprender sobre as dinâmicas entre Japão e Coreia do Sul. Também ouvi dizer que a tradução para português está bastante boa, por isso podem agarrar-se a ele mesmo que não se sintam confortáveis em ler em inglês. Já leram Pachinko? Se sim, qual a vossa opinião?

 

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O que é o Clube do Livra-te?

É o clube do livro do podcast Livra-te — calma, não precisam de acompanhar o podcast para participar nas leituras. Todos os meses, cada uma de nós escolhe um livro para ler em conjunto convosco e vocês podem optar por ler a escolha da Joana, a escolha da Rita ou ambas. Depois, podem deixar a vossa opinião no grupo do Goodreads ou no Discord. Podem juntar-se a qualquer altura, venham daí!

Sex | 12.05.23

Japão // Kyoto & Hiroshima

Já tinham saudades de ler coisas sobre o Japão? Mesmo que não tivessem, eu estava com saudades de recordar esta viagem e, por isso, cá estamos para vos falar do que fizemos durante os nossos dias em Kyoto. Antes de avançar, só uma pequena nota para quem só chegou agora aos posts sobre o Japão: já anda por aqui uma publicação sobre o que saber antes de ir, a primeira e a segunda parte dos dias passados em Tokyo.

 

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No dia em que chegámos, vindos da capital, só tivemos tempo e vontade de fazer check-in no hotel e jantar num dos restaurantes que ficava dentro da estação de metro mais próxima — pode parecer estranho, mas o Tonkatsu Wako Zest Oike é especializado em tonkatsu e a comida é mesmo muito boa. Relativamente ao alojamento, voltámos a escolher um hotel e foi o melhor de toda a viagem, com bastante espaço e óptimas condições.

 

E agora, avancemos então para o que fizemos nos quase três dias em Kyoto, uma cidade que nos recebeu com uma chuva miudinha permanente:

 

DIA 1 — ARASHIYAMA & TEMPLOS

Tínhamos o tempo muito contado em Kyoto, já que um dos dias seria reservado para conhecer Hiroshima, então sabíamos que era preciso aproveitar os dias da melhor forma e começar bastante cedo. Foi isso que fizemos logo no primeiro dia na cidade: depois de um pequeno-almoço rápido no hotel, fomos logo em direcção à paragem, onde apanharíamos um autocarro para a nossa primeira paragem — Arashiyama, a floresta de bambu.

 

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Tinha lido em alguns blogues de viagem que esta zona pode ser uma pequena desilusão para quem estiver à espera de uma enorme floresta de bambu, mas como eu já sabia ao que ia, não aconteceu. Lá perto também passámos pelo templo Nonomiya e comemos algumas coisas nos mercados de rua, nomeadamente dango, aquelas bolinhas doces de arroz. Continuámos a manhã nos arredores da cidade, onde está a maioria dos templos, para visitar o Daikakuji e o Kinkakuji — o primeiro tem um lado e jardim muito bonitos e o segundo está todo coberto a folha de ouro.

 

 

Vale muito a pena o passeio, até pela calma que contrasta muito com Tokyo, mas vale ainda mais a pena parar para almoçar no Sabanji, que tem o melhor ramen que comi em toda a viagem. Lá só há mesmo uma especialidade de ramen, por isso a escolha fica facilitada: é só dizerem se querem médio ou grande e esperar por uma das melhores coisas que vão comer na vida.

 

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A parte da tarde foi passada na baixa da cidade: percorremos a rua principal (Kiyamachi-dori) e visitámos o templo Yasaka, que tinha um festival com várias bancas de comida. Visto que o dia começou bem cedo e que fomos comendo coisas em quase todos os sítios por onde parámos, instituímos jantar de loja de conveniência e fomos descansar para estarmos bem no dia seguinte.

 

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DIA 2 — HIROSHIMA

Assim que começámos a planear esta viagem ficou claro para mim que quereria ir pelo menos umas horas a Hiroshima. Não é segredo para ninguém que eu gosto de visitar locais onde aconteceram desastres ou com uma história menos feliz, porque me interessa saber como é que as cidades se reconstruíram e incluíram a memória dos acontecimentos na vida das pessoas.

 

Hiroshima fica a cerca de 1h30 de comboio de Kyoto e foi uma agradável surpresa: é uma cidade bastante gira, com um bom equilíbrio entre calma e agitação urbana, onde se respeita a tragédia que aconteceu. Recebeu-nos com o céu cinzento, mas o dia foi melhorando progressivamente e acabou por ficar bastante sol. A primeira coisa que fizemos foi passear no Shukkein, um dos jardins mais bonitos de toda a viagem, que tinha imensas cerejeiras ainda em flor. A seguir visitámos o Castelo de Hiroshima por fora, onde ainda é possível ver árvores que sobreviveram à explosão da bomba atómica.

 

 

Antes de visitarmos os monumentos mais relacionados com o desastre, decidimos passear pela zona de Hondori e parar para almoçar. Queríamos experimentar okonomiyaki, uma espécie de panqueca frita com vários ingredientes — entre eles couve — e sabíamos que são feitas de maneira diferente nesta cidade, por isso fomos directos ao Okonominura, onde comemos demasiado bem.

 

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Antes de regressar a Kyoto, passeámos então na zona do Peace Memorial e da Atomic Bomb Dome, onde os turistas respeitam as filas para tirar fotografias e se vive uma atmosfera de solenidade e respeito, sem ser demasiado pesado.

 

 

No regresso a Kyoto, tivemos ainda tempo de passar pela livraria Maruzen, que recomendo bastante porque é enorme e tem uma excelente selecção de livros em inglês.

 

 

DIA 3 — FUSHIMI INARI, KIYOMIZU-DERA & PARTIDA PARA OSAKA

Kyoto fica bastante perto de Osaka (cerca de meia hora de comboio), então não tínhamos propriamente pressa e tirámos a manhã deste dia para visitar dois sítios: Fushimi Inari e o templo Kiyomizu-dera. Tentámos ir o mais cedo possível, conscientes de que são duas zonas muito turísticas, mas mesmo assim estavam ambas cheios de gente. Não deixam de ser dois locais interessantes de visitar, sobretudo Fushimi Inari, mas, lá está, vão cedo.

 

 

Almoçámos na estação de Kyoto, mas não num sítio qualquer. É que, no 10º andar do edifício, há uma panóplia de restaurantes de ramen, de todas as especialidades possíveis e imaginárias. Nós escolhemos o Ramen Todai, que serve a especialidade da zona de Tokushima — não só ficámos muito bem servidos, como prontíssimos para seguir viagem até Osaka.

 

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Na próxima semana, naquele que será o último post sobre a viagem ao Japão, prometo contar-vos o que fizemos ainda nesse dia, quando chegámos à cidade, bem como todas as aventuras dos dias seguintes e do regresso a Tokyo. Por enquanto, já sabem que a caixa de comentários está à vossa disposição para deixarem todas as perguntas!

Qui | 11.05.23

The Starless Sea, Erin Morgenstern

Sabem quando se atiram completamente para fora da vossa zona de conforto nas leituras? Foi exactamente o que quis fazer com The Starless Sea, de Erin Morgenstern — porém, não foi o facto de ser um género diferente do habitual que me fez terminar este livro com mixed feelings. Vou só dar um passo atrás e falar-vos da premissa da história, para que percebam depois as minhas dificuldades.

 

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Zachary Ezra Rawlins descobre um livro misterioso na biblioteca da Universidade — ao lê-lo, no meio de histórias de amor e de colectores de chaves, encontra um episódio da sua infância, algo que viveu e nunca partilhou com ninguém. Isto faz com que vá em busca da história por detrás deste livro e, no processo, encontre a porta para uma biblioteca antiga, escondida debaixo da terra. Claro que há mais na história, mas acredito que baste a premissa para vos enquadrar em tudo aquilo que este livro prometia — sociedades secretas, algum realismo mágico, livros e, até, gatos.

 

Strange, isn’t it? To love a book. When the words on the pages become so precious that they feel like part of your own history because they are. It’s nice to finally have someone read stories I know so intimately.

 

The Starless Sea tinha tudo para ser um daqueles livros que gritam “Rita da Nova” por todo o lado e, ainda assim, sinto que me falhou mais do que conquistou. Gostei bastante da construção inicial do mundo em que a história se passa e da apresentação das personagens, mas faltou alguma orientação ao enredo e, acima de tudo, explicações no final. Claro que não é preciso que os autores expliquem exactamente tudo o que se passa nos livros, há uma certa margem importante de interpretação, mas aqui senti-me francamente perdida.

 

A escrita de Erin Morgenstern foi a melhor parte deste livro e acabei a destacar imensas citações pela forma como a autora consegue resumir alguns pensamentos em palavras. Em certas partes pareceu-me haver necessidade de uma ediçãozinha, mas, de resto, gostei bastante do estilo dela e quero muito dar uma oportunidade ao The Night Circus — algumas pessoas cuja opinião valorizo já leram e gostaram muito.

 

Alguém já leu este livro (traduzido para português com o título Um Mar Sem Estrelas)? Se sim, partilham da minha opinião?