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Rita da Nova

Ter | 29.03.22

Suíte Tóquio, Giovana Madalosso

Entrar mais na literatura brasileira contemporânea é algo que está nos meus planos de leitora. Fui inclusivamente à Livraria da Travessa recentemente e trouxe de lá um livro meio às cegas, mas depois falo-vos sobre ele. Para já, quero muito contar-vos a minha experiência com Suíte Tóquio, de Giovana Madalosso, que veio parar cá a casa a propósito de uma oferta da Fnac.

 

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Ainda bem que mo ofereceram porque, caso contrário, era provável que o livro me tivesse passado ao lado — não por não ser o meu género, mas porque tenho a certeza de que outros livros iriam ganhar a minha atenção primeiro. Não conhecia a autora, mas bastou ler o primeiro capítulo para me apaixonar pela escrita e para ter a certeza de que adoraria a história. Não me enganei.

 

Suíte Tóquio conta a mesma história através de duas perspectivas: a de Maju, ama da menina Cora, e a de Fernanda, a mãe da menina. Logo no início entendemos que Maju faz planos de raptar a criança e de a levar consigo para Mandaguaçu, onde nasceu e cresceu antes de ir para São Paulo trabalhar. Completamente embrenhada na sua vida profissional e amorosa, Fernanda demora algum tempo a entender que a filha desapareceu. À medida que acompanhamos as duas linhas de narração vamos entendendo os motivos que levaram Maju a querer ficar com Cora e as razões pelas quais Fernanda parece ligar pouco à criança.

 

Estou raptando uma criança. Tento afastar esse pensamento, mas ele persiste enquanto descemos pelo elevador, cumprimentamos o Chico, saímos pelo portão. São coisas que fazemos todos os dias, descer, cumprimentar o Chico, sair pelo portão, andar pisando só nas pedras pretas ou nas brancas da calçada, mas hoje é diferente mesmo que eu não esteja fazendo nada diferente, porque tenho a sensação de que o exército branco olha pra mim. Foi coisa da dona Fernanda, inventar esse nome, exército branco. E até que ela está certa, somos mesmo um exército, ainda mais a essa hora da manhã, quando todas vêm pra praça com seus uniformes brancos carregando bebês ou crianças, e então batem papo empurrando carrinhos e balanços com bebês ou crianças. Um mundo que até ontem era o meu mundo mas que agora parece me olhar com desconfiança. Será tudo loucura da minha cabeça? Diga, minha Nossa Senhora, é tudo loucura?

 

O que mais gostei neste livro, além da forma como a escrita de Giovana Madalosso se transforma para dar vida a cada uma destas personagens, foi o facto de nenhuma delas ser a “boa da fita” — ambas estão a fazer coisas profundamente erradas, mas quando as conhecemos melhor conseguimos entender porquê. É um excelente livro sobre a maternidade: sobre mulheres que quererem ser mãe e não podem, sobre mulheres que podem e não usufruem, e sobre o ressentimento que existe entre estes dois grupos.

 

Li algumas reviews no Goodreads, de leitores brasileiros, que afirmam que estas personagens são meio caricaturadas. Podem até ser, mas parece-me um pouco necessário que o sejam, para nos conseguirem fazer empatizar com dois géneros de pessoas tão diferentes. Mas bom, gostava de saber a vossa opinião, caso o tenham lido. Falamos ali nos comentários?