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Rita da Nova

Ter | 16.03.21

Fahrenheit 451, Ray Bradbury

Como já vos tinha dito a propósito do tema de Março d’Uma Dúzia de Livros, há uns anos tinha tentado pegar em Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, mas houve qualquer coisa que me impediu de avançar logo nas primeiras páginas. Fiquei espantada porque, supostamente, teria todos os ingredientes para me cativar: é uma distopia centrada em livros e é muitas vezes considerado um clássico. 

 

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Acredito cada vez mais que há livros próprios para certas alturas e que, às vezes, nos cruzamos com o livro certo na altura errada – aprendi a compreender os meus ciclos de leitura, a entender que para mim não funciona ler vários livros pesados de uma assentada e que preciso de ir intercalando leituras em inglês com leituras em português, assim como digital com físico. Quando peguei neste livro pela primeira vez não tinha tanta consciência dos meus ritmos enquanto leitora e achei mesmo que talvez não funcionasse para mim. 

 

Mas agora, vários anos depois, peguei-lhe e li-o bem depressa. Curioso, não é? Explicando, para quem não conhece, do que se trata: Fahrenheit 451 passa-se numa altura em que os bombeiros deixaram de apagar fogos para pegar fogo a todos os livros que apanham; quem é visto a ler livros é considerado louco, uma vez que a leitura se tornou ilegal. O nosso protagonista, Guy Montag, é um desses bombeiros, que começa aos poucos a tentar descobrir o que são os livros e porque é que são demonizados. 

 

Guy Montag passa de mau da fita a herói quando começa a tentar salvar livros – se consegue e qual o desfecho desta história é algo que terão que descobrir através da leitura, que eu não estou aqui para estragar nada a ninguém. Em traços gerais lembrou-me muito o 1984, mas acho que é porque quase todas as distopias são inspiradas, de certa forma, nesta obra.

 

Everyone must leave something behind when he dies, my grandfather said. A child or a book or a painting or a house or a wall built or a pair of shoes made. Or a garden planted. Something your hand touched some way so your soul has somewhere to go when you die, and when people look at that tree or that flower you planted, you're there. It doesn't matter what you do, he said, so long as you change something from the way it was before you touched it into something that's like you after you take your hands away. The difference between the man who just cuts lawns and a real gardener is in the touching, he said. The lawn-cutter might just as well not have been there at all; the gardener will be there a lifetime.

 

Em traços gerais é um bom livro, levanta discussões importantes sobre censura, a estupidificação da sociedade de massas, a importância de cultivarmos a curiosidade para além das dos filmes que todos vêem e dos livros que todos lêem. Para além disso, mostra também que todos podemos fazer a diferença, mesmo que na nossa ignorância estejamos a fazer algo de errado – temos sempre capacidade de aprender e lutar. Ainda assim, estava à espera que o livro me marcasse mais do que marcou, provavelmente pela antecipação de o ler e pela segunda oportunidade que lhe dei. Acho que o li tarde no meu percurso de leitora e, depois de me ter cruzado com tantos livros, este não me chegou especialmente ao coração. 

 

De qualquer das formas, é mesmo um clássico, tanto para quem gosta de distopias como para quem está à procura de um livro para se iniciar neste género. Contem-me lá: há por aí alguém que está em falta com este, como eu estive durante tanto tempo?