Sigrid Nunez já me tinha passado pelo Instagram, TikTok e Goodreads, mas nunca tinha prestado muita atenção. No outro dia enquanto andava a ver os descontos no Kobo e em busca de algo leve para ler, dei com The Friend, da autora, com uma premissa muito engraçada – depois do suicídio do seu melhor amigo, a protagonista vê-se meio forçada a ficar com o cão dele.
Se ao início o cão, um Grand Danois, é apenas uma fonte de problemas (pelo tamanho e por não serem permitidos cães no prédio em que vive), com a convivência este cão passa a ser a sua única forma de ligação ao amigo e mentor que perdeu. Ia à espera de um livro que explorasse apenas a relação desta mulher com o cão, mas esse é apenas o ponto de partida desta narrativa. The Friend é, acima de tudo, uma lição rápida sobre escrita, sobre perda e sobre luto.
What are we, Apollo and I, if not two solitudes that protect and border and greet each other? It is good to have things settled. Miracle or no miracle, whatever happens, nothing is going to separate us.
É um livro muito pequenino que se lê bastante bem, mas que está bastante bem escrito. Sigrid Nunez tem uma capacidade que admiro muito: é concisa na escrita, mas não lhe retira nenhum do significado que quer passar. Não esperem grandes descrições ou páginas e páginas bem escritas, mas sem conteúdo concreto. A autora consegue ser directa e emocional ao mesmo tempo, com um toque de humor ácido que eu valorizo muito.
Portanto, sim: recomendo muito este livro, não que a história seja incrível, mas por estar extremamente bem escrito. Deixa-nos agarrados pela qualidade de escrita e não tanto pelo enredo – será que isto faz sentido? Quem já conhecia a autora e este The Friend?
A minha primeira leitura de 2021 foi um daqueles clássicos que me habituei a ver por aí, mas nunca lhe tinha prestado muita atenção até ver que havia uma nova adaptação para filme na Netflix. Rebecca, de Daphne du Maurier, não é o tipo de livro que normalmente leio – é uma novela gótica, cheia de suspense e, confesso, houve ali partes em que tive um certo medinho.
Para quem não conhece de todo este livro: a nossa narradora, de quem nunca sabemos o nome, conhece Maxim de Winter em Monte Carlo enquanto trabalha como dama de companhia de uma senhora americana. Quando essa senhora adoece a meio das férias, Maxim e a narradora começam a desenvolver uma relação de amizade e, pouco tempo depois, Maxim pede-a em casamento. Com o casamento vem a possibilidade de ir morar para Manderley, onde de Winter vivia com a ex-mulher, Rebecca, que morreu recentemente.
We can never go back again, that much is certain. The past is still close to us. The things we have tried to forget and put behind us would stir again, and that sense of fear, of furtive unrest, struggling at length to blind unreasoning panic - now mercifully stilled, thank God - might in some manner unforeseen become a living companion as it had before.
O entusiasmo da narradora desaparece assim que começa a adaptar-se à vida em Manderley e percebe que a figura de Rebecca está sempre, de alguma forma, presente. Eu diria até que Rebecca é a personagem principal deste livro, embora já esteja morta e nunca apareça, nem em flashbacks. E se, ao início, a narradora acha que veio ocupar um espaço que todos consideram insubstituível, ao longo da história vai percebendo que talvez Rebecca não tenha sido a mulher que ela pensava.
Vou parar por aqui para não estragar, porque acho que toda a gente merece ir sendo surpreendida à medida que avança neste livro. Vão à confiança, mesmo não sabendo muito mais do enredo porque a magia deste livro está mesmo neste deslindar de um novelo de mistérios e segredos. E mais não digo! Quem desse lado já leu este livro e/ou viu as adaptações para filme?
Eu não leio muita poesia, mas sempre que leio penso porque é que não leio mais. Provavelmente isso também vos acontece com um género específico e, para mim, a poesia é um território meio estranho, que não acompanho mas que me surpreende sempre. Este Fósforos e Metal sobre Imitação de Ser Humano, de Filipa Leal, foi uma dupla surpresa – primeiro, foi-me oferecido vai fazer agora um ano, com muito carinho e sem eu estar à espera; depois, esperou pacientemente cá em casa até eu decidir pegar-lhe no último dia de 2020 e adorei.
Além de ser um “manual para a entrada nos 40”, segundo a própria autora, é também uma tentativa de passar para a poesia uma espécie de exposição de escultura imaginária. A autora criava estas esculturas na sua cabeça e associava-lhes uma história em forma de poema. O resultado são pequenos fragmentos do que podemos considerar uma “vida normal”, com amores, desamores, ilusões e desilusões.
Filipa Leal tão depressa nos mostra aquilo que sente no momento, numa antecipação em relação ao futuro, como nos leva até à infância e às memórias das férias passadas em Vigo – as idas ao El Corte Inglés e tudo o que lá comprava em pequena. A leitura deste livro foi uma experiência muito intimista, quase como se estivesse a conversar com alguém que conheço bem. E vou deixar aqui um dos meus poemas favoritos deste livro:
Mesmo que, como eu, não sejam muito de ler poesia, este livro vale muito a pena. Já conheciam a autora? Confesso que foi só quando recebi este livro que a conheci.
Ainda a propósito do último post, e dos livros que de repente viram moda e toda a gente parece estar a lê-los a certo momento, este TheMidnight Library começou a aparecer-me em tudo o que era sítio – no TikTok, no Instagram, nos blogues de leitura que sigo e foi, inclusivamente, vencedor do livro de ficção do ano no Goodreads. Apesar de não me ter parecido um sucesso consensual, gostei da premissa e decidi fazer dele o meu último livro de 2020.
Nora Seed, a protagonista infeliz deste livro, acha que não tem mais motivos para viver e decide matar-se. Mas em vez de deixar de viver, vai parar à The Midnight Library, uma biblioteca que parece ser interminável e é gerida por Mrs. Elm, a bibliotecária da escola que frequentou quando era pequena. Neste purgatório em forma de biblioteca, Nora percebe que cada livro corresponde a uma realidade paralela, a uma vida que poderia ter vivido caso tivesse tomado outras decisões.
Between life and death there is a library, and within that library, the shelves go on forever. Every book provides a chance to try another life you could have lived. To see how things would be if you had made other choices… Would you have done anything different, if you had the chance to undo your regrets?
Ao longo do livro vamos acompanhando Nora nessas diferentes vidas, sempre em busca da verdadeira felicidade e de desfazer todos os arrependimentos que foi coleccionando ao longo da vida. O livro é essencialmente sobre isso: sobre encontrarmos o que nos faz realmente felizes e percebermos que nem sempre é aquilo que achamos que seria.
When you stay too long in a place, you forget just how big an expanse the world is. You get no sense of the length of those longitudes and latitudes. Just as, she supposed, it is hard to have a sense of the vastness inside any one person. But once you sense that vastness, once something reveals it, hope emerges, whether you want it to or not, and it clings to you as stubbornly as lichen clings to rock.
Gostei muito da premissa e achei a escrita de Matt Haig muito fluida e fácil de seguir, mas o livro não me convenceu completamente. A certa altura foi fácil para mim perceber o que ia acontecer no fim e senti que o autor passou muito tempo a fazer a personagem andar de vida em vida, para no final entregar aquilo que todos nós calculamos que vá acontecer depois de ela experimentar dois ou três destinos alternativos. De qualquer das formas lê-se muito bem e achei-o muito visual – na minha humilde opinião daria um filme incrível. Só não achei que fosse tudo aquilo que fui lendo por aí.
Também dão por vocês a não entender todo o hype que certo livro tem ou teve? E quanto a este TheMidnight Library, já o leram? O que acharam? Estou prontíssima para vos ver discordar de mim 👇