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Rita da Nova

Ter | 20.08.19

Desafio 1+3 // O que aprendi com alguém importante

Nunca vires as costas ao mar, gritavas-me de todas as vezes que me vias, cheia de coragem nos olhos e determinação nas pernas, a tentar sair da água.

 

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Esquecia-me sempre de que não se deve deixar de olhar as ondas até termos os pés bem aterrados na areia. E tu fazias questão de mo dizer, como se nunca o tivesses dito antes e eu não tivesse obrigação de já ter aprendido.

 

Ao fim de sete ondas vem sempre uma maior, ensinaste-me também. E eu ficava ali a contá-las. Uma, duas, três. Quatro, cinco, seis. Sete. A tua ciência não era exacta – nem sempre era ao fim das sete –, mas a onda grande acabava sempre por chegar e marcava o ciclo, como quem vem só para avisar que a festa acabou.

 

Contava-as, não para te provar errado, mas para confirmar que tinhas razão; que o teu conhecimento das marés era infinitamente mais profundo que o dos pescadores e navegadores. Tinhas a alma salgada e revolta, embora nunca subisses a um barco ou soubesses dar nós. Não pescavas, não amanhavas peixe, nunca te viram nadar, mas trazias o grito das gaivotas na voz.

 

De vida pregada na praia, aprendeste a respirar a maresia com o corpo todo. Sabias de mar e sabias-me a mar, e, para mim, isso sempre bastou.

 

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Este post insere-se no Desafio 1+3, lançado pela Carolina do blog Thirteen. A ideia é falarmos de nós mesmos, sempre com um olhar crítico sobre as nossas atitudes, crenças e gostos. Todos podemos participar e não há regras ou datas fixas. Cada um escreve quando e sobre os temas que quiser, dentro daqueles que forem sendo lançados pela Carolina. Juntam-se a nós? Basta enviarem um e-mail à Carolina para participar!

Seg | 19.08.19

Os livros da Rita // Raparigas Como Nós, Helena Magalhães

Em Julho decidi comprar uns vasinhos e uma t-shirt giríssima à Helena Magalhães, na Magapaper - a sua mais recente loja online cheia de coisas giras. Em vez de escolher entrega pelo correio, pedi para ir levantar presencialmente. Andámos desencontradas uma e outra vez, até que finalmente conseguimos combinar.

 

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Recebi a Helena numa pausa para café a meio do trabalho e, obviamente, começámos a falar de mil e uma coisas, entre elas os livros. Até que ela tira um livro de dentro de um saco e eu percebo que é o livro dela, Raparigas Como Nós. Tinha-o trazido para me oferecer e eu fiquei sem palavras com este gesto tão bonito. Depois de acabar o que estava a ler, peguei logo neste.

 

É o segundo livro que escreve, mas é o primeiro romance e isso tem algo de muito especial. Ao longo das páginas de Raparigas Como Nós, a Helena conta-nos a história de Isabel - uma miúda apaixonada por livros, pela escrita, e muito diferente daquilo que as “miúdas normais” são na adolescência. Identifiquei-me muito com a personagem, como podem calcular.

 

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O livro passa-se em 2004, em sítios que também foram os meus sítios na adolescência: o Chiado, o Estoril, até Madrid. Embora tenham um mood teen, as páginas deste livro levaram-me invariavelmente para momentos que vivi nesta altura atribulada da vida de uma rapariga. Os primeiros amores, os primeiros desgostos, as amizades e as primeiras experiências adultas… está tudo lá.

 

Não é o meu género de literatura favorito, mas lê-se muito bem e nem sempre é uma história simples e inocente. Sobre isso não quero adiantar-vos grandes detalhes, já que uma palavrinha fora do sítio pode trazer spoilers. Está escrito de uma forma tranquila e suficientemente cativante para se tornar uma excelente leitura de praia (eu sei o que digo, apanhei bastante sol na sua companhia!).

 

Quem desse lado já conheceu a história da Isabel? O que acharam? Contem-me tudo nos comentários!

 

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Raparigas Como Nós por Helena Magalhães

Avaliação: 7/10

Qui | 15.08.19

Restaurantes // O Nobre by Justa Nobre

Só tinha estado n’O Nobre by Justa Nobre uma vez há muitos anos, quando esta minha coisa de conhecer restaurantes novos ainda estava muito no início. Na altura gostava mais de conhecer sítios com gastronomias diferentes, um bocadinho fora do que é a comida tradicional portuguesa - e talvez por isso a experiência não me tenha ficado na memória. De uma coisa me lembrava: da presença marcante que tanto a Chef Justa como o seu marido, José Nobre, têm no restaurante.

 

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Esse lado manteve-se inalterado, mal chegamos parece que estamos a ser recebidos na casa deles. Essa atenção é transversal ao resto do staff, que nos foi deixando vários petiscos e palavras simpáticas enquanto esperávamos. Estes pratinhos com várias iguarias é uma das maiores características deste restaurante: quando nos sentamos, podemos contar com algumas entradinhas tipicamente portuguesas para ir entretendo a fome.

 

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O último jantar do Dividimos a Conta foi uma verdadeira viagem pelos sabores portugueses e por alguns dos pratos de assinatura da Chef Justa. Depois de petiscarmos umas torradinhas com manteiga de caju e uns belíssimos Peixinhos da Horta, inaugurámos a refeição com uma Sopa de Santola. Eu, que não sou fã de marisco, já da primeira vez me tinha perdido de amores por esta sopa. É rica sem ser demasiado consistente e agora, em vez de vir para a mesa na casca da santola, é trazida numa tigela feita pela Vista Alegre - uma parceria criada entre a marca e a Chef.

 

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Seguiu-se um Filete de Robalo com Camarão e Puré de Ervilhas que era mesmo, mesmo bom. O peixe desfazia-se, o puré estava no ponto e o molho dos camarões envolvia tudo muito bem.

 

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Como éramos três - eu, a Mariana e a Margarida - optámos por escolher três sobremesas para partilhar. Veio um Bolo de Chocolate Quente, uma sobremesa de Frutos Vermelhos e outra de Doce de Ovos. Chocolate é vida, derretido então é maravilhoso - podem logo perceber qual a minha favorita, certo?

 

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Quem desse lado tem curiosidade em conhecer as iguarias da Chef Justa Nobre? Recomendo muito que o façam neste restaurante, no Campo Pequeno, onde vão certamente sentir-se em casa.

 

O Nobre by Justa Nobre Menu, Reviews, Photos, Location and Info - Zomato

Seg | 12.08.19

Dividimos a Conta // Mariana Cabral n'O Nobre

Conversar com a Mariana - mais conhecida como Bumba na Fofinha - sobre comida é, invariavelmente, entrar numa cápsula do tempo que nos leva às memórias de infância. Apesar de ter crescido com três irmãos mais velhos, a expressão “dividir irmãmente” não era muito conhecida lá em casa. “Eu sinto que, ainda hoje, me dá ansiedade quando vejo pouca comida porque o meu botão da sobrevivência se activava quase todos os dias. Não é que não houvesse comida suficiente, nunca nos faltou nada, mas havia uma luta pelo bife maior, por sermos os primeiros a repetir.”

 

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Se, por vezes, até tinham que esconder o pacote de bolachas mensal que a mãe comprava para cada um, havia momentos em que tinham que unir esforços. “A minha mãe no meio de quatro filhos era capaz de se baralhar, como é normal, e comprava assim uma vez de nove em nove meses, aquela papa Cerelac de frutos em vez da normal. Tu imaginas isto, Cerelac de tutti-frutti? Era um incidente diplomático lá em casa, tínhamos que nos unir, que fazer uma espécie de concílio para discutir. Ninguém queria tocar naquilo, mas também não havia assim tanto orçamento para se deitar comida fora. Era um drama durante várias semanas para acabarmos aquilo.”

 

Esclarece que não havia pancadaria à mesa (só fora dela) e que esta convivência com os irmãos influenciou muito a forma como come ainda hoje. Os meus irmãos são uns alarves e eu, nessa sofreguidão de comer, habituei-me a comer quantidades astronómicas como eles. Eu não como como uma lady, em como como uma grandecíssima alarve!”, conta-me, quando já estamos sentadas à mesa d’O Nobre by Justa Nobre e provamos uns Peixinhos da Horta.

 

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Confessa que hoje em dia tem alguns cuidados com a alimentação, mas que não se inibe de comer se for algo de que gosta muito. “Quando é uma coisa que eu adoro é perdida por cem, perdida por mil, como até à náusea, às vezes. Por exemplo: sou fortíssima no polvo, mas assim à lagareiro. Gosto de arrozadas boas, tipo uma paella, um arroz de ligueirão, arroz de pato. Uma boa massa, um bom risotto… eu no fundo gosto de tudo. Sou relativamente exigente, mas se for bom e bem feito como até não ser sensato. Eu nem sequer penso muito bem nisso, depois fico ali a digerir até à exaustão e arrependo-me.”

 

É comum ver a Mariana assim, “com os recursos do corpo dedicados a jiboiar”, depois de eventos familiares como a Páscoa e o Natal. É também nessas alturas que acontecem alguns confrontos geracionais. “Aprendi a gostar de uma coisa que se faz em casa da minha avó, que se chama castanhada. É um doce de castanha, estamos a falar de não sei quantos quilos de castanhas que têm que ser cozidas, descascadas e depois tritura-se tudo numa misturada que leva noz moscada, açúcar, uma série de coisas. É um doce meio de velho, sabes? É um doce para apreciar aí a partir dos 30, sendo que o Bolo Rei é a partir dos 90.”

 

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“As fatias mais jovens da família criticam imenso, dizem que é uma sobremesa de velho e que está a ocupar o lugar de outra sobremesa melhor, mas de repente há um dia em que percebes que envelheceste um pouco porque experimentas uma colher de castanhada e pensas: que iguaria absolutamente excelsa.”

 

Enquanto nos deliciávamos com a Sopa de Santola, um clássico da Chef Justa Nobre, a conversa pendeu naturalmente para a forma como o nosso paladar vai mudando ao longo dos tempos. Em crianças somos esquisitos, na temporada de Erasmus comemos tudo o que for barato e nos alimentar, mas quando nos tornamos adultos ficamos muito mais críticos. “Estou bastante mais exigente com o sushi, eis uma coisa que muda com a idade. Comecei a comer sushi naqueles de tapete, em Erasmus. O peixe já vinha meio cadavérico e azedo, mas marchava porque era novidade e era super barato.”

 

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“Acho que em Erasmus bati os recordes de quase apanhar escorbuto à conta da alimentação porque, enfim, não tinha muito dinheiro e então alimentava-me muito à base da chamada tortilla do Carrefour Express. Repara nisto, era uma tortilla que custava 1€! Mas uma tortilla que dava para bastante gente! Ora, não se compreende o modelo de negócio daquela tortilla, portanto até que ponto é não era poliéster?”

 

Depois de Erasmus, só em viagens é que arrisca em comer coisas meio estranhas - e mesmo assim não é muito aventureira. “Nas Filipinas eles têm uma espécie de caneca com feto de galinha. Se eu comi isso? Não comi, mas provei a espécie de caldo que acompanha, que supostamente é super nutritivo. É um grande nojo de ver, mas o caldo é quase como se fosse uma canja. Recentemente estive na Tailândia e uns amigos provaram escorpião à minha frente. Dizem que não é mau, que sabe assim a camarão. Agora, eu vi-os a trincar tudo como se fosse tipo batata frita e nem sei bem como é que aquilo se come. Mas é nos insectos que eu páro.”

 

[Seguiram-se uns 7 minutos de conversa sobre baratas e traumas com o bicho, que não vou reproduzir aqui porque esta rubrica ainda é sobre comida.]

 

Sri Lanka e Islândia são os dois destinos que destaca do ponto de vista gastronómico. “No Sri Lanka come-se muito bem e como 80% da população é budista, a comida é quase toda a base de vegetais que eles cozinham muito bem. Cozinham coisas que eu nunca tinha provado (tipo quiabos), têm vegetais muito diferentes dos nossos também. Mas depois é perigoso porque quase todos os pratos trazem coconut sambol, que são raspas de coco com chili. Esta menina foi à confiança da primeira vez, pensei ‘giro, tempero simpático’, comi uma colherada inteira e ia falecendo. Uma dica importante é nunca ir à confiança nestes países, é ir testando pouco a pouco.”

 

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Uma coisa que a impressionou no Sri Lanka foi o respeito que as pessoas têm pela comida. “É falta de educação falar à mesa. Supostamente a comida é um momento para estar enraizado e a agradecer a refeição. Claro que eu aprendi isto quando fui mal-educada e estava aos berros à mesa, não é?” Ou seja: muito diferente da nossa cultura e, em particular, deste jantar que tivemos n’O Nobre, onde a conversa andou aleatoriamente por vários temas, muitos deles sem estarem relacionados com a comida.

 

Agora que chegou oficialmente à idade adulta, a Mariana é claramente mais uma pessoa de cozinhar do que de comer fora. “Cozinho bem, até. É uma mistura entre intuição e aproveitar o que está no frigorífico, não sou de fazer receitas muito completas. Cozinho bem vegetais de formas diferentes, mas não sou muito de assados, nunca sei bem como é que isso se processa e nunca me ocorre no dia-a-dia. Não há paciência para marinadas, na minha vida não me permito planear o suficiente para uma marinada, não consigo pensar tão longo prazo. Há relações que duram menos que essa marinada!”

 

Um dos seus melhores pratos chama-se “massa para a ressaca” e, segundo ela, está cheia de coisas gordas - cheia de parmesão e com um ovo molhadinho no fim. Ficou desde logo combinado um novo jantar, quem sabe com esta massa como prato principal, para podermos continuar a falar de viagens, comida e outros temas avulsos que vão surgindo. Se ainda não conhecem a Mariana (acho difícil, mas vocês é que sabem), não deixem de rir com ela no Instagram e YouTube.

 

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1. Refeição favorita? Pequeno-almoço. 

2. Cozinhar ou comer fora? Cozinhar.

3. Um restaurante de sempre? Café Império. 

4. Uma moda gastronómica de que até gostas? Abacate em tudo. 

5. Algo que cozinhas especialmente bem? Quinotto. 

6. Uma alergia? Nada!

7. Chá ou café? Café. 

8. Uma comida do mundo? Pad Thai. 

9. Um restaurante que querias que se mantivesse segredo? Cevicheria, para conseguir ir lá pelo menos uma vez.

10. Dividir a conta ou cada um paga o que comeu? Dividir a conta.

 

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Este é o último post da rubrica Dividimos a Conta. Durante 12 meses convidei uma pessoa por mês para almoçar ou jantar fora em restaurantes Zomato Gold, para conversarmos sobre a sua relação com a comida. O que gosta, o que não gosta, o que aprendeu a gostar, mas manias, as receitas de família… enfim, o que surgir. A parte boa é que, com a Zomato Gold, temos sempre direito a um prato grátis a compra de outro (e se usarem o código RITADA, têm 25% de desconto na subscrição de qualquer pacote).

 

[Todas as fotografias deste post são da autoria da Margarida Pestana.]